domingo, 15 de abril de 2012

Carmen Silva

Carmen Silva (Carmem Silva Maria Amália Feijó), atriz de rádio, teatro e televisão, nasceu em Pelotas, Rio Grande do Sul, em 5 de abril de 1916. Tornou-se atriz em 1939, na Rádio Cultura, emissora de sua cidade, e adotou o nome artístico de Carmen Silva.

No mesmo ano, viajou com a Companhia Iracema de Alencar com a peça "Peg do Meu Coração", de John Hartley Manners. Transferiu-se para Porto Alegre e trabalhou em "Romeu e Julieta" e "Otelo", de William Shakespeare, produções de Ribeiro Cancella, pai de seu futuro marido, o humorista e músico Cancellinha.

No Paraná, atuou na Companhia Totó. Em São Paulo, fez radionovelas na Tupi, América e Record. Além de representar, escreveu programas femininos, humorísticos e infantis, entre os quais se destacaram: "Sequência Alegre" e "Nós, As Mulheres", este último estrelado por Nair Belo.

Em 1955 entrou para a Companhia Dulcina de Moraes e inaugurou o Teatro Guairinha (Curitiba) com a peça "Vivendo em Pecado", de Terence Rattigan. Com Dulcina ainda apareceu em "O Imperador Galante", de Raimundo Magalhães Júnior e "Chuva", de Somerset Maugham.

Em 1957 segue com a Companhia Maria Della Costa para a Europa com os espetáculos Manequim, de Henrique Pongetti, "O Canto da Cotovia", de Jean Anouilh, e "Rosa Tatuada", de Tennessee Williams.

A partir de 1961 integrou o Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), trabalhando em "A Escada", de Jorge Andrade; "Yerma", de Garcia Lorca; "A Revolução dos Beatos", de Dias Gomes; e "Os Ossos do Barão", de Jorge Andrade.

Em diferentes períodos participou do grupo Teatro do Rio, de Ivan de Albuquerque e Rubens Corrêa. Voltou a São Paulo em 1972, com a montagem de "Em Família", de Oduvaldo Vianna Filho, sob a direção de Antunes Filho, contracenando com Paulo Autran. Em 1973 conquista o Prêmio Molière por seu desempenho em "Mais Quero Asno que Me Carregue que Cavalo que Me Derrube", de Carlos Alberto Soffredini, com a direção de Elvira Gentil.

Na Cinédia fez seu primeiro filme em 1935: "Estudantes", de Wallace Downey, com Aurora Miranda e Mesquitinha. Em 1949 participou do último musical dirigido por Adhemar Gonzaga: "Quase no Céu", ao lado de Walter D’Avila e Renata Fronzi.

Em 1958 roda com Roberto Santos "O Grande Momento", inspirado no neorrealismo italiano, um dos mais importantes filmes da década.

Em 1974 faz "Guerra Conjugal", com Joaquim Pedro de Andrade, baseado em contos de Dalton Trevisan, no qual contracenou com Jofre Soares. Recentemente participou de "A festa de Margarette", de Renato Falcão, e "Concerto Campestre", de Henrique de Freitas Lima, filmes realizados em 2002.

Na televisão estreiou em 1956, na TV Record, em "Anos de Ternura". Em 1970 apareceu em "Pigmaleão 70", na TV Globo, ao lado de Tônia Carrero e Sérgio Cardoso. Em 1973 marcou presença em delicada composição na novela "Os Ossos do Barão", ao lado de Paulo Gracindo. Por toda a década foi presença constante na TV, na qual se destacou: na TV Tupi, em "A Viagem" (1975) e na TV Bandeirantes, em "O Ninho da Serpente" (1982). Na novela "Mulheres Apaixonadas", na TV Globo (2003), emocionou o Brasil ao lado de Oswaldo Louzada, dando vida a um casal que se tornou símbolo da luta pelos direitos dos idosos.

Em 2004 recebeu o Troféu Cultura Gaúcha, homenagem do governo gaúcho pelo conjunto de sua obra. Muito ligada às suas raízes, participou da série "Continente de São Pedro", produção da RBS TV, com argumento de Carlos Urbim, sobre a história do Estado do Rio Grande do Sul.

Depois de reunir em 2002 seus textos radiofônicos no livro "Comédias do Coração" e "Outras Peças para Rádio e TV", teve sua história registrada pela jornalista Marilaine Castro da Costa em "Carmen Silva, a Dama dos Cabelos Prateados".

Atriz de delicadas interpretações em teatro, cinema e televisão, era no dia-a-dia uma mulher simples e discreta que se dedicou à família e aos amigos e manteve acesa a alegria de viver.

Carmen Silva morreu no dia 21/04/2008, aos 92 anos, em Porto Alegre.

Fonte: http://www.funarte.gov.br

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Siwa, a rainha do sex appeal

Siwa - 1959
Aparecida Maria Castro Augusto nasceu em São Paulo (capital) em 4 de fevereiro de 1924. Siwa formou-se como bailarina clássica e aos 12 anos já fazia parte do corpo de baile do Municipal de São Paulo. Foi solista e também fez carreira no Municipal do Rio. Apresentou-se ao lado de grandes bailarinas.

Ainda nos anos 40, fundou, com outros profissionais da dança, o tradicional Ballet Pigalle. Entre os grandes balés de que participou, estão "O Julgamento de Páris", "Mozartiana" e "Divertissements".

Apesar de ter verdadeira paixão pela dança clássica Siwa fugia um pouco dos padrões estéticos das bailarinas da época, pois fazia o tipo boazuda: quadris largos, coxas bem torneadas e cintura fina. 

No início dos anos 1950, fez incursões no teatro de revista dançando em teatros e boates. Entre seus números dessa época está o famoso French Cancan. Siwa nunca chegou a ser girl. Na revista começou como bailarina e pouco tempo depois já era vedete.
 
A partir de 1952, com o fim do Ballet Pigalle, Siwa adotou o nome artístico de Siwa Tzen e optou, sem medo, pela revista. Uma de suas primeiras aparições como vedete foi em "Eva me Leva", no Follies, em janeiro de 1952. Seu primeiro papel de destaque foi em "Poeira do Chão" (1952), com a Cia. Mary-Juan Daniel. O elenco da peça era encabeçado por Elvira Pagã, Dalva de Oliveira e Zeloni, mas Siwa foi a grande atração.

Em 1953, já empresária e estrela de sua companhia, apresentou sucessos como "Uma Pulga na Camisola", no Teatro Alumínio, em São Paulo. Em 1958 fez um grande sucesso com "Disfarça... e Bota a Mão". Trabalhou com a Cia. Mary e Juan Daniel; Cia. Ney Machado e outras.

Em 1953, montou a sua própria companhia: Siwa e Sua Companhia de Revistas de Bolso. Dentre as revistas que fez, estão "Poeira do Chão" (1952); "Eva me Leva" (1952); "Eu Quero é me Rebolar" (1953); "O Mágico do Catete" (1953); "Uma Pulga na Camisola" (1953); "É Sopa no Mel!" (1954); "Mulheres à Bangu" (1954); "Mão na Toca" (1957); "Coquetel de Boas"; "Disfarça... e Bota a Mão" (1958); "Mulheres, me Afobei!" (1960). Fez, também, shows na boate Ranchinho do Alvarenga (1952), Casablanca, Monte Carlo.
 
Siwa era flexível, tinha grande desenvoltura cênica e se expressava muito bem com o corpo. Sua sensualidade não residia apenas no belo físico, mas também em sua postura insinuante e sugestiva. Tinha um tipo exótico, era morena alta com rosto marcante: lábios grandes, sobrancelhas arqueadas, olhos amendoados, sorriso devastador. Era chamada de "a misteriosa", se apresentava com roupas sempre extravagantes e incomuns no teatro, como vestes orientais, folclóricas, estampas de onça, etc...
 
Siwa foi casada com o comediante Vagareza (Hamilton Augusto). Conheceram-se no teatro de revista, quando atuaram juntos em   "Poeira do Chão" (1952). Montaram companhia própria no fim dos anos 1950, com bastante sucesso. Foi o terceiro empreendimento de Siwa como empresária de revista.

No início dos anos 1960, Siwa e Vagareza fizeram estrondoso sucesso, como dupla, em diversos humorísticos da TV Rio e da Tupi. Permaneceram casados até a morte de Vagareza, em 1997.

Siwa era ousada: em 1954, organizou uma nova companhia constituída apenas de mulheres, tendo apenas um varão em cena: o comediante Spina. Fez temporada em Campos, lançou grandes girls e vedetes, e importou meninas do Follies Bergère.Também lançou vedetes como Wilma Palmer e comediantes como Costinha. Foi considerada a atriz mais elegante e bem-vestida de 1954.
 
Durante a temporada de "Disfarça... e Bota a Mão" (1958), no Teatro São Jorge, ela fez um ensaio fotográfico para J. Trovão. Um retrato se destacou: o que ela trajava uma fantasia de baiana. Trovão levou a imagem a uma agência de publicidade e a foto foi escolhida para a campanha publicitária da câmera fotográfica Minolta, da empresa japonesa Rokkor. A tal imagem de Siwa  vestida de baiana foi parar em Tóquio, reproduzida em banners e outdoors. Fez tanto sucesso que vários apaixonados japoneses  lhe enviaram cartas (em japonês). Por isso, foi apelidada de "A preferida dos japoneses". 

Um de seus quadros de grande sucesso chamava-se "A Neurastênica" da revista "Poeira do Chão" (1952), em que ela entrava cantando assim: "Eu quero achar um remédio eficaz / Para poder meus nervos acalmar, / Meu mal não sei diagnosticar... / Será que é neurastenia? / Se um bonitão me vem falar / Começo logo a me assanhar / Mas se ele vem muito perto, / Eu quero logo é brigar! / É neurastenia meu mal-estar, / É neurastenia... / Que não se pode curar! / Se eu encontrar alguém que é capaz / O meu remédio logo acertar, / Eu faço qualquer negócio / Qualquer negócio... / Menos casar!"

Desce e improvisa com a plateia:  "O senhor seria tão gentil... Podia indicar-me um remédio? Eu vejo um rapaz, fico louca para falar com ele, mas quando ele chega perto de mim eu sinto uma coisa esquisita. Eu sinto vontade de apertar, apertar, apertar, até... Asfixiar! Não sei o que é que eu tenho".
 
Para outro senhor: "Ah, é você mesmo! O senhor vai me ajudar. Indique-me um remédio! Como? Não quer que eu chegue perto? Não tenha medo, eu agora estou calma. O que foi que o senhor disse? Não tem o remédio? Ah! O senhor tem o remédio sim! Se eu procurar eu acho.  Garanto!"
 
Sobe ao palco e canta: "É neurastenia meu mal-estar, / É neurastenia... / Que não se pode curar! / Se eu encontrar alguém que é capaz O meu remédio logo acertar, / Eu faço qualquer negócio / Qualquer negócio... / Menos casar!".
 
Siwa também fez cinema, na Atlântida, com "Os Apavorados" (1962), uma das últimas chanchadas de Oscarito. Também tomou parte no filme "Eu Sou o Tal" (1959), que o marido protagonizou.

Em 1968 voltou ao ballet clássico e fundou – com o marido – a Siwa Ballet Morumbi, em São Paulo. A escola existe até hoje e é uma das mais tradicionais da cidade. Atualmente é administrada por sua filha, Vânia. 

Faleceu no dia 1° de abril de 2009, em São Paulo, aos 84 anos.  

Fonte: As Grandes Vedetes do Brasil - de Neyde Veneziano.

Joana D’Arc, a vedete escultural

Anna do Couto Martins nasceu em Araguari (MG), em 2 de julho de 1925. Mudou-se para o Rio de Janeiro, ainda bem jovem, com  sua  mãe. Desde criança cultivava o desejo de seguir a carreira artística.

Ao ler num jornal que a Companhia Beatriz Costa e Oscarito estava selecionando girls para o seu próximo espetáculo, viu uma oportunidade para realizar seu sonho. Apresentou-se no Teatro João Caetano e logo foi contratada.

Estreou como girl na revista "Garotas de Além-mar", em 1944, aos 19 anos. A carreira de girl durou pouco. Sua figura ganhou destaque entre as coristas, e no espetáculo seguinte, "Fogo na Canjica", ganhou suas primeiras falas. Foi nessa época que  adotou o nome artístico de Joana. Mais tarde, adicionou o sobrenome D’Arc, em alusão à famosa heroína francesa. A sugestão foi de Beatriz Costa, por acreditar ser um nome forte, que combinava com sua figura marcante no palco. Participou ainda de   outras revistas, destacando-se, principalmente, nas carnavalescas.
 
Após o término da companhia, Joana ingressou no balé do empresário Carlos Lisboa, em 1947. O balé se apresentava em teatros e também em casas noturnas. Excursionou para o Sul, fazendo uma temporada no Rio Grande. Em Pelotas, conheceu o ator Procópio Ferreira que, na ocasião, estava com sua companhia de comédias fazendo uma temporada na cidade. O popular ator se encantou com a morena e a convidou para fazer parte de sua companhia. Joana aceitou na hora. Procópio era um dos mais famosos e influentes atores do Brasil.
 
Estreou na comédia "Sua Excelência, o Criado". Apresentaram-se em mais algumas cidades e, em seguida, estrearam no Teatro Serrador, no Rio de Janeiro. Mas ela sentiu falta da revista. Não gostava da comédia. Achava monótono um espetáculo sem música, sem fantasias, sem escadarias, sem a alegria da revista. Joana D’Arc, então, se descobriu vedete. 

A experiência com Procópio foi a única fora do teatro de revista. Durante toda a sua vida artística, Joana D’Arc foi exclusivamente uma vedete. Tradicional de teatro e do palco. Apesar de ter feito apresentações em boates e cabarés, era no   palco, de preferência nos da Praça Tiradentes, onde se encontrava plena e absoluta.

Em 1948, retornou ao gênero musicado, na Companhia de Dercy Gonçalves. Já não era uma simples vedetinha, mas um dos destaques do elenco. Fez "Manda Quem Pode"; "Cara Malfeita" e "Noites Cariocas". Sua ascensão foi rápida.

No ano seguinte, apareceu no elenco de grandes produções recordistas como "Brotinhos e Tubarões"; "Olha a Boa!" e "Quero Ver isso de Perto". Todas estreladas por Renata Fronzi, a vedete sensação.

O grande responsável pelo sucesso de Joana D’Arc era seu corpo. Ela era um mulherão. Não tinha nada de mignon. Era alta e imponente. Tinha curvas generosas e pernas perfeitas. Foi chamada de A Escultural, pela crítica. Mas Joana não era só um corpo que se movia com graça. Cantava, dançava – rebolava e dizia – com muita malícia – textos de double sens. Um de seus números famosos foi apresentado em "Bonde do Catete" (1950), no João Caetano. Vestida de vendedora de cigarros, usando uma minissaia, declamava: "O senhor, quieto, velhinho, / Mas que pita o seu fuminho / E engasga com a nicotina, / Bem pode voltar ao jogo / E fumar com vitamina /  Pois eu lhe ofereço fogo!".
 
Ainda em 1950, fez parte do elenco do fenômeno "Muié Macho, sim Sinhô", de Walter  Pinto. O espetáculo é considerado um dos melhores de toda a carreira teatral do empresário. Ficou cinco meses em cartaz com lotações esgotadas. Faturou mais de quinze milhões de cruzeiros. Encabeçando o elenco, Oscarito, Virgínia Lane, Pedro Dias, Grande Otelo, além da cantora Dalva de Oliveira.

O estrelato daquela que era considerada o corpo mais perfeito do teatro brasileiro, pelo jornalista Brício de Abreu, só aconteceu em fins de 1951. Após sagrar-se Rainha das Atrizes, no tradicional concurso do Baile das Atrizes, estrelou absoluta "Boa... Até a Última Gota", no João Caetano. 

Ambiciosa, Joana D’Arc lançou sua própria companhia, em 1953 – mesmo ano em que foi eleita, por Sergio Porto, uma das "Dez mais bem despidas", lista que no futuro se imortalizaria como "As certinhas do Lalau". Encenou no João Caetano "Bomba da Paz", uma revista milionária, financiada por um admirador. Dividiu o estrelato com Dercy Gonçalves, mas o empreendimento  fracassou. Mesmo com o tremendo prejuízo, continuou.

No ano seguinte, montou uma nova companhia, agora tendo Silveira Lima como financiador. Estreou em São Paulo, em temporada no Teatro Alumínio, com três revistas: "Rainha da Alegria"; "Tudo de Fora" e "Pernas Provocantes". Com essa última apresentou-se no Rio de Janeiro, no Teatro Glória (na Cinelândia). Dessa vez, Joana D’Arc e a companhia fizeram sucesso. 

Com tudo acertado para estrear no Teatro Colón, em Buenos Aires, Joana D’Arc abandonou a carreira de vedete e empresária. Mudou-se para os Estados Unidos. Foi viver com William Bird, um milionário apaixonado. O romance não durou muito tempo e, da América, Joana partiu para uma temporada, como vedete, na Europa. Em Portugal, atuou no Teatro Coliseu, promovida pela amiga Pepa Ruiz II. Fez também apresentações na Espanha e na França, em cassinos, boates e cabarés.

Voltou ao Brasil somente em 1957. A partir daí sua carreira já não tinha o mesmo impacto. Apesar de vencer, pela segunda vez, o concurso de Rainha das Atrizes, atuou, somente, em cinco revistas entre 1958 e 1960. Seu último espetáculo foi "Entre Pernas e Plumas", no Teatro Recreio (1960). Completou 16 anos de carreira e se despediu dos palcos com a seguinte frase: "A gente tem de sair de cena, enquanto a casa ainda tem público". 

Em 1966, foi convidada pelo revistógrafo Meira Guimarães para uma reentré artística, no show Frenesí, no Golden Room do Copacabana Palace. Recusou. Preferiu ficar imortalizada na memória de seus fãs, em bons espetáculos, na fase áurea da revista. O seu negócio era o teatro, o palco. Era uma vedete em toda a sua essência.
 
Joana D’Arc teve dois filhos, Maria Margarida e David Barata – que atualmente mantém um blog sobre a mãe vedete. Faleceu no Rio de Janeiro, em 1º de novembro de 2003, aos 78 anos de idade, vítima de um infarto. 

Fonte: As Grandes Vedetes do Brasil - de Neyde Veneziano

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Luz del Fuego


Se hoje as mulheres têm direitos garantidos e podem assumir sua posição no meio da liberação sexual sem tantos tabus, muito devem a mulheres transgressoras que viveram antes delas. Infelizmente, muitas dessas representantes da ousadia, sempre a frente do seu tempo, acabam esquecidas entre as páginas da história (Imagem do livro "A bailarina do povo", de Cristina Agostinho - Ed. Best Seller).

Filha de comerciantes de Cachoeiro do Itapemirim (ES), a menininha Dora nasceu numa segunda de Carnaval. Fazia muito calor naquela madrugada de 21 de fevereiro de 1917. Ela era a 15ª filha do casal Etelvina e Antonio Vivacqua. A família Vivacqua   era grande e respeitada. Quando eles se mudaram para Belo Horizonte, a menininha de seis anos começou a apresentar gostos meio estranhos: ela gostava de ir ao serpentário do Instituto Ezequiel Dias e pegou uma cobra na mão no dia em que foi ao circo. Foi, também, uma adolescente rebelde e provocativa. Após a morte do pai, interrompeu os estudos e foi morar com o irmão mais velho no Rio de Janeiro.

No Rio, conheceu Cesar Ladeira, locutor da Rádio Mayrink Veiga que a introduziu no meio artístico e na high society. A   família não gostou de seus comportamentos inadequados e acabou mandando a moça voltar a Belo Horizonte.

Em 1936, Dora foi  morar com a irmã Angélica, casada com Carlos. Foi quando Angélica encontrou o marido assediando Dora e resolveu interná-la no Hospital Psiquiátrico Raul Soares. Dora ficou isolada durante dois meses. Quando saiu, transformou-se em presença incômoda e contava pra quem quisesse ouvir o caso do assédio.

Foi obrigada a passar uma temporada na fazenda. Foi quando ela se meteu no mato e voltou nua com duas cobras-cipó enroladas   no corpo, mandando o filho do administrador fotografá-la. Resultado: nova internação, dessa vez numa casa de saúde do Rio de Janeiro. Estava com 20 anos. Quando saiu do hospital, foi morar em Campos (RJ). 

Dos 21 anos em diante, teve uma vida cheia de fugas, emoções e desafios. Recusou um pedido de casamento, tirou brevê, quis ser paraquedista, apaixonou-se, desiludiu-se e decidiu ser dançarina sensual coadjuvada por serpentes. Arranjou uma jiboia, deu-lhe o nome de "Anjo" e treinou-a durante 12 semanas. Mas a cobra morreu durante o último ensaio antes da estreia. Já experiente, domesticou e treinou duas outras cobras. Depois de dois anos, dezessete dias e quase cem mordidas, fez seu espetáculo na companhia do casal de jiboias "Cornélio" e "Castorina".

Em 1944, virou a atração da noite no palco do picadeiro do Circo Pavilhão Azul, sendo anunciada como "A Luz Divina e suas incríveis serpentes".Também nesse ano estreou no teatro de revista, no espetáculo "Tudo é Brasil", no Teatro Recreio. Fez seus bailados com as cobras e muito sucesso, ao lado de Jararaca & Ratinho, Colé, Celeste Aída e Aracy Côrtes.

Apresentou-se em outros circos de periferia no Rio de Janeiro e acatou a sugestão do palhaço Cascudo: mudou o nome artístico para "Luz del Fuego", que era como se chamava o batom argentino da Carmen Miranda.
 
Luz seguiu salvando circos da falência até que, em 1950, foi contratada pelo casal Juan Daniel e Mary Daniel 1, donos do Teatro Follies, em Copacabana. No ano seguinte, ela foi para o Teatro Recreio.

Um dos seus grandes sucessos foi "Eva no Paraíso" (1951). A peça era fraca, mas ela brilhava com seus brotinhos cultivados na ilha nudista que apareciam no quadro "O nu através dos tempos". A "Verdade Nua" (1952) a fez voltar ao follies com a família Daniel. Luz, com suas cobras, se sobrepunha aos esforços de Zeloni e a beleza das follies-girls. Também atuou na companhia de Dercy Gonçalves e no Teatro de Zaquia Jorge. Bastava colocar seu nome nos cartazes que era bilheteria garantida.

Em um de seus quadros famosos ela aparecia de freira e, com ar sério, caminhava até o proscênio, dizendo:  – Eu sei que os senhores me consideram uma mulher leviana, imoralíssima, e não querem me ver nem como irmã de caridade. Vocês estão doidos é para me ver pelas costas, não é mesmo? Está bem!

E quando dava as costas  para o público, o que se via era seu traseiro completamente nu. A plateia ia ao delírio.
 
Em meio a esses acontecimentos positivos Luz publicou seu livro "Trágico Black-Out", cheio de relatos sobre a sedução do cunhado. Neste livro, apresentava, também, suas ideias naturalistas, vegetarianas e nudistas: "Um nudista é uma pessoa que acredita que a indumentária não é necessária à moralidade do corpo humano. Não concebe que o corpo humano tenha partes indecentes que se precisam esconder". 

Publicou "Verdade Nua", o livro em que lançou bases de sua filosofia naturalista. As autoridades deram sumiço na obra. A segunda edição foi vendida por reembolso postal. O dinheiro serviu para arrendar uma ilha na qual se instalaria a sede do seu clube naturalista.

Na primeira metade dos anos 1950, Luz causava furor por onde passava. Era conhecida em todo o País. Doava renda de seus espetáculos para instituições beneficentes. Era atração também durante o carnaval, quando aparecia nua em cima de carros alegóricos. Sempre acompanhada das cobras.

Criou o PNB (Partido Naturalista Brasileiro) à custa de espetáculos gratuitos, que fazia seminua, nas escadarias do Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Luz obteve licença para viver na ilha Tapuama de Dentro, que foi rebatizada como Ilha do Sol. Essa ilha, na Baía de Guanabara, passou a ser uma das grandes atrações turísticas do Rio de Janeiro. Ali funcionava o Clube Naturalista Brasileiro, o primeiro clube de nudismo da América Latina. Em sua fase áurea de 1956 a 1961, chegou a ter 240 sócios, apesar dos protestos da Igreja.

Nos anos 1960, Luz passou a viver, definitivamente, na Ilha do Sol. Suas reservas financeiras terminavam, a idade chegava e o mito começou a desaparecer. Seus amantes já não eram homens influentes e ricos. Envolveu-se com Júlio, um pescador musculoso  e analfabeto, com quem manteve uma relação de muitos meses. 

Como precisava de dinheiro para obras no clube, retornou aos palcos em 1965, com "Boas em Liquidação". Na ilha, passou a receber poucos amigos e alguns casos amorosos, encerrando as atividades do clube.
 
Em 1967, Luz del Fuego e seu caseiro foram assassinados. Seus corpos foram amarrados em pedra e lançados ao mar. Os criminosos, presos, confessaram. Mas a tragédia da Ilha do Sol teve requintes de crueldade e muitos fatos não explicados. 

Luz foi ousada, avançada e, ao mesmo tempo, fiel aos seus princípios. Apesar de frequentar as festas noturnas regadas a  álcool, não fumava nem ingeria bebidas alcoólicas. Ela teve sua vida transformada em filme, estrelado por Lucélia Santos.

O dia 21 de fevereiro, data do seu nascimento, é comemorado como o Dia do Naturismo.

Fonte:  As Grandes Vedetes do Brasil - de Neyde Veneziano; Vila Mulher - Terra.

Os anos 1950 e o fim dos cassinos

Elvira Pagã, na Revista de Copacana
Em abril de 1946, os jogos de azar foram proibidos no Brasil, por ordem do presidente Eurico Gaspar Dutra, sob a influência   da sua mulher Carmela Teles Leite Dutra, conhecida como Dona Santinha, por sua vez, influenciada pela Igreja Católica. 

Essa proibição teve forte efeito sobre os atores do teatro de revista que transitavam pelos shows de cassinos completando suas rendas e fazendo-se conhecidos de outras plateias. Havia muitos artistas que trabalhavam exclusivamente em shows de cassinos.

Desempregados migraram para o teatro. O fim do jogo no País e a extinção dos cassinos provocaram un tour de force de homens empreendedores, a fim de que o divertimento e o dinheiro fossem desviados para outros locais e com outros tipos de   lazer e entretenimento.  

Essa sociedade sofisticada que movimentava restaurantes e night clubs era chamada de café society. O maior desses homens empreendedores era Carlos Machado, também conhecido como "O Rei da Noite". Ele institucionalizou o show de boate e tornou famosas suas boates Monte Carlo, Casablanca e Night and Day. Colocou um palco menor, cuidou da sonorização e dos ambientes, chamou as melhores e mais bonitas vedetes, os melhores músicos e revistógrafos experientes para escrever esquetes. Serviu muito whisky aos frequentadores e, aos poucos, assumiu o strip tease nas altas horas. A este conjunto, que era também outro modo de fazer teatro de revista, chamaram "Teatro da Madrugada". 

Os shows se caracterizavam por trazer os elementos básicos do teatro de revista para um espaço menor: a boate. Renata Fronzi e Cesar Ladeira faziam isso no espetáculo Café Concerto, dando mais ênfase à parte musical com influência direta dos cabarés  parisienses. 

Paralelamente, o teatro de revista continuava como o movimento teatral mais expressivo do Rio de Janeiro. Mas agora, a vedete ganhava mais força e importância. Esta figura, no início, dividia as atenções com cômicos e bons textos.

Na década de 1950, a vedete está em primeiríssimo plano. Eram pra ela todas as atenções. Se cantasse bem, melhor. Mas o  importante era que fosse escultural. De preferência, com as medidas da Vênus de Milo ou, um pouco mais brasileira, como Marta Rocha. Com o fim do jogo, Walter Pinto e os outros empresários apostaram todas as fichas na beleza de suas vedetes. 

Entre 1953 e 1954 o biquíni, já comum nos palcos da revista, ainda era proibido em praias brasileiras. Em Copacabana as garotas que tentassem aparecer com o traje sumário sofriam repressão policial. Mas em 1957, o uso da peça já havia sido liberado na praia de Copacabana. Os costumes mudavam rapidamente. A década de 1950 marcava, também, a era do nudismo.

Elvira Pagã e Luz del Fuego – as duas musas do nudismo – garantiram a bilheteria de várias revistas, consideradas fracas pela crítica. A nudez de ambas, já valia o espetáculo. Como atrizes, eram sofríveis. Como vedetes, desde que não se exigissem delas talento musical e desenvoltura cênica, convenciam e prendiam as atenções masculinas.

Os teatros lotavam. Casais iam assistir. Mas ninguém comentava no dia seguinte. Elas eram péssimos exemplos para as jovens. Naquela época, o pecado ainda estava na moda. 

Fonte:  As Grandes Vedetes do Brasil - de Neyde Veneziano.

Salomé Parísio

Salomé Parísio
Salomé Parísio nasceu em 3 de junho de 1921 em Bonito -PE. Seu nome de batismo é Dulce de Jesus Oliveira, mas resolveu adotar o nome da mãe para entrar no meio artístico. Começou a carreira cantando na Rádio Clube de Pernambuco. A partir daí fez shows em cassino até ser levada para o teatro de revista.

A mulher com as mais belas pernas, como ficou conhecida, foi descoberta por Chianca de Garcia, um famoso empresário teatral. A comediante Celeste Aída enviou uma foto de Salomé para o empresário que imediatamente pediu que ela embarcasse rumo ao Rio de Janeiro. Chegando ao aeroporto, Chianca, com um forte sotaque português, lhe disse: "É a mulher que eu quero".

Sua estreia foi no espetáculo "Um Milhão de Mulheres", ao lado de Colé e Celeste Aída. Já começou como vedete e estrela do espetáculo. Do Rio foi para São Paulo, onde atuou em "Eu Quero é me Badalar"; "Cai cai Balão"; "É com Essa que eu Vou", entre outras. Trabalhou em filmes do Mazzaropi, voltou a fazer parceria com Colé e trabalhou ao lado de Virgínia Lane.
 
Em 1950, Salomé Parísio foi para Portugal. Estreou "Saias Curtas", espetáculo que fez enorme sucesso no Cassino do Estoril. Em 1955, a Argentina se rendeu aos encantos e às pernas de Salomé. Foi outra temporada grandiosa.

Mas Salomé estava prestes a receber o maior convite de sua vida: substituir Carmen Miranda nos Estados Unidos. Tudo começou   quando o famoso arquiteto Oscar Niemeyer, fã confesso da vedete, levou o empresário Carlos Machado para assistir a um show de Salomé. Machado, conhecido como o rei da noite, era produtor de musicais de revista. Seus espetáculos faziam sucesso na alta sociedade brasileira. Só que ele já havia produzido três espetáculos nos Estados Unidos que não tinham agradado o público. Por isso, o empresário americano que o contratara veio ao Brasil escolher os artistas pessoalmente para seu próximo show. O americano, encantado com Salomé, exclamou: "She’s wonderful!"

E lá foi Salomé, com Nelson Gonçalves, estrelar o show Extravagância Brasileira na Radio City Music Hall, em NovaYork, em 1960. O espetáculo foi um estouro. Havia sessenta mulheres no palco e de repente entrava Salomé Parísio, de costas, cantando: "Soca, soca, soca pilão, Abana sinhá, peneira na mão". O público delirava com o rebolado da morena. O maestro, sem entender a letra da música, pedia para ela entrar de frente, não de costas.

Ele falava: "Miss Salame (era assim que os americanos pronunciavam), please, look for me". E ela falava: Não!Tem que ter o re-bo-la-do. O maestro ficava hipnotizado com o requebrado da vedete e acelerava a música de acordo com o balanço do quadril de Salomé, deixando doidos os músicos da orquestra.
 
O plano do empresário americano era ensaiar Salomé Parísio para substituir a estrela internacional Carmen Miranda. O projeto contava até com um filme em Hollywood para o lançamento da artista. Mas Salomé não viveu o seu sonho. Sua mãe sofreu uma fratura no fêmur e Salomé abandonou o trabalho para cuidar da mãe.

De volta ao Brasil, foi trabalhar com Walter Pinto. Com o declínio do  teatro de revista, continuou a fazer shows como cantora, foi contratada pela Tupi e fez "Almoço com as Estrelas", com Airton Rodrigues. Também participou do "Clube dos Artistas", com Lolita Rodrigues, depois foi para a Record e Bandeirantes.Trabalhou com Dercy Gonçalves no Esplanada, no Rio de Janeiro, e com vedetes como Anilza Leoni, na revista "Chica da Silva 65", em que interpretava a personagem-título.

O ex-governador de São Paulo, Adhemar de Barros, dizia que ia ao teatro só para ver a pinta da perna de Salomé Parísio e exclamava: "Você é a número 1". 

Se os Estados Unidos escolheram Marilyn Monroe para cantar para seus soldados antes de ir à guerra, o Brasil preferiu Salomé Parísio. A artista foi convidada a cantar para os pracinhas brasileiros antes da partida deles para a Itália, na Segunda Guerra Mundial. 

Salomé também participou da lendária montagem de "Macunaíma", dirigida por Antunes Filho. Em novelas trabalhou em "Sangue do meu Sangue" de Vicente Sesso, em 1969, ao lado de Fernanda Montenegro, Tônia Carrero, Sadi Cabral e Armando Bógus, e fez uma participação na primeira versão de "Mulheres de Areia", em 1973, na TV Tupi.

Na década de 1980 participou das peças "Violinista no Telhado", "Dilúvio" e "Aí vem o Dilúvio".
 
Salomé Parísio vive hoje em São Paulo e continua a cantar, a fazer shows e programa festejar seus 60 anos de carreira com um grande espetáculo. Em suas aparições ainda  canta uma marchinha que sempre fez sucesso: "Beata, ta, beata, ta, / Este coco saboroso / Você come / E não me dá...".  

 Fonte:  As Grandes Vedetes do Brasil - de Neyde Veneziano.